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Rio Branco,17/06/2025

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Com marreta e silêncio, ICMBio destrói a esperança de uma família na Reserva Chico Mendes

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Com marreta e silêncio, ICMBio destrói a esperança de uma família na Reserva Chico Mendes

O que seria apenas mais uma live de denúncia rural virou, no fim da manhã de segunda-feira, 16, um grito coletivo de dor. Mariana Rodrigues, filha de um dos produtores tradicionais da Reserva Extrativista Chico Mendes, transmitiu ao vivo o momento em que o curral de sua família — recém-esvaziado de gado pela operação Suçuarana — era destruído pela equipe do ICMBio. O que seus olhos viam não era madeira sendo arrancada. Era a vida sendo desfeita, num cenário onde o suor do povo da floresta é esmagado por um Estado ausente e uma política ambiental cega à realidade.

“Isso aqui é suor, é trabalho, é esforço. É tudo o que a gente tem”, disse Mariana, chorando, com o celular nas mãos.

No fundo da transmissão, o som das marretas e da madeira partindo. Na voz da jovem, o desespero de quem vê a própria história sendo levada por mãos que não a conhecem.

Barricada de joelhos no barro

A dor de Mariana ecoa a de muitos. Desde a última sexta-feira, 13, a BR-317 — única rodovia que conecta o município de Xapuri a Assis Brasil e à fronteira com o Peru — foi bloqueada por produtores rurais da reserva. Homens e mulheres montaram barricadas improvisadas com pedaços de madeira e pneus queimados. Na madrugada de domingo, 15, de joelhos no meio da estrada, os produtores imploravam que os caminhões boiadeiros não levassem o gado.

“A gente não está pedindo esmola. A gente só quer manter nosso sustento aqui dentro da floresta”, disse um dos manifestantes, ajoelhado. “Estão nos tratando como bandidos, não somos, somos trabalhadores. Estão dizendo que vão atirar em nós, não somos bandidos”.

Foto REDE SOCIAL

O bloqueio humano acabou vencido pela força armada do ICMbio, momento em que os animais começaram a ser embarcados nos caminhões boiadeiros.

Em toda essa crise, o que mais dói aos moradores não é só a perda do gado ou a destruição dos currais. É o abandono. Nenhum representante do governo do Acre se pronunciou publicamente. A presença do governador Gladson Cameli era esperada pelos produtores, mas não ocorreu esse encontro.

O conflito que ninguém quer ver

A Reserva Chico Mendes é território extrativista. Por lei, é permitido o uso sustentável da terra, incluindo pequenas criações de gado para subsistência. Mas na prática, o avanço da pecuária — muitas vezes como única alternativa real de renda — colocou centenas de famílias em rota de colisão com as diretrizes do ICMBio.

Desde o início da operação Suçuarana, mais de 300 cabeças de gado já foram removidas da reserva. E, segundo relatos, os próximos alvos são os currais, como o da família de Mariana. A destruição das estruturas visa impedir a reinserção dos animais. Mas quem vive ali diz que está sendo punido por sobreviver.

“Ninguém apareceu aqui para nos dar uma alternativa. Só chegaram para destruir. Que país é esse que arranca o sustento da própria população e vira as costas?”, questiona Mariana.

Na live, Mariana encerra com a voz embargada, segurando o celular com as mãos tremendo. Atrás dela, pedaços do curral espalhados pelo chão. Um silêncio pesado toma conta do local. Ela não grita, não xinga, não reage com violência. Ela apenas chora. “Essas pessoas estão destruindo os nossos sonhos.”

O que é a operação Suçuarana?

A operação Suçuarana é uma ação coordenada pelo Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade (ICMBio) com o objetivo de remover criações consideradas irregulares de gado na Reserva Extrativista Chico Mendes, no Acre.

Segundo estimativas de moradores e lideranças locais, mais de 300 cabeças de gado já foram apreendidas desde o início da operação. Os protestos realizados pelos moradores da reserva, que chegaram a interditar a BR-317 por três dias, têm como principal motivação a ausência de diálogo, a falta de alternativas econômicas viáveis e o abandono por parte do Estado. Para eles, a pecuária representa o único meio de garantir sustento em meio à floresta.

Até o fechamento desta reportagem, nenhuma autoridade estadual esteve presente na região para prestar apoio, ouvir os produtores ou apresentar soluções para o impasse.




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